terça-feira, 5 de agosto de 2008

[1]

- Não.
- Por quê?
- Porque não.

Porque não, oras.

Mnhas explicações vis me enojam. E me bastam.
Sou rasa.
Nem por isso cheia.

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Sofrendo e aprendendo

Sempre achei que o sofrimento, mais que a bebida, mais que as drogas, fosse a inspiração pura.
Até o dia em que eu sofri demais e não consegui escrever uma linha sequer.
As coisas foram ficando um hiato, vazio e separado. Vazio, vazio... Como se fossem só o espaço que as separava.
Outra coisa que eu percebi com o sofrimento demais é que ele afasta as pessoas. Todas as pessoas. Até as melhores, que ficam com você até o final de todas as coisas. Porque sofrimento espalha. Só sabe gerar a ele mesmo. Ninguém gosta de ficar por perto.
Sofrimento demais é hífen.
Sofrimento demais é sempre demais.
E sempre necessário.
Entende?

In Memorian

Tem coisas que só de lembrar, pode nem ser de todos os detalhes, ou das mínimas feições, mas que trazem por si só aquela ânsia. Aquela necessidade contida de rasgar a lembrança como se foto, dessas que a gente pode deixar em mil pedaços até não reconhecer mais. Fato é que eu acredito na perenidade da memória, (in)felizmente. Não de todas as coisas. Mas das principais, ou das que pareciam insignificantes até você perceber que não são mais - nunca de fato o foram. E outra... Mesmo que a foto ou a lembrança se tornem irreconhecíveis, você não vê mais com a mesma claridade aquilo, mas sabe que aquilo ainda existe. Ainda respira, se alimenta, vive e se reproduz na sua cabeça dia após dia. Sem morte.
Excrucitante.
Às vezes podem até ser confundidas com saudades. Ou deixar saudades. Mas é bem diferente: "Saudade é um pouco como fome. É um dos sentimentos mais urgentes que se tem na vida." [C. Lispector] Isso é mais como um vômito.. Tão urgente quanto, mas com uma diferença vetorial que faz toda a diferença.

quarta-feira, 25 de junho de 2008

em construção I

Sim. Era assim. Como se o corpo dela fosse todinho escrito em braile e tivesse sido, por suas mãos, tantas vezes traduzido, que ele o tinha decorado. Sabia de cada palmo, cada cicatriz, cada pinta dele. Sabe quando acontece de acabar a luz da casa da gente e mesmo no escuro, sabermos onde estão as coisas, a que distância exatamente devemos virar ou subir um degrau? Então... Nunca se sentia perdido no corpo dela, por mais força com que fechasse os olhos, por mais no escuro que se encontrasse.

E é. Era onde se encontrava, agora. Há anos que não a via e não existia escuro maior que esse, mas, mesmo assim, vez ou outra, contra tudo e contra todos – e contra ele e contra ela – a desenhava. Perfeitamente em cada detalhe. E com o mesmo deleite com o qual descobrira pela primeira vez aquele corpo todo novo, todo seu, vulnerável.

Há uma música bonita, a preferida do pai dela, que diz que os detalhes acabam sumindo na longa estrada, aquela que transforma o amor em quase nada. Mas ele discordava disso. O amor podia sim virar quase nada. Podia, aliás, virar nada, mas os detalhes... Eram justamente os detalhes que ficavam!

O jeito com que ela mordia o cabo da escova de dentes, antes de escová-los, para poder amarrar o cabelo, impedindo que ele caísse na pia na hora de cuspir a pasta, e ficava tentado conversar com ele com aquele cabo na boca, dizendo palavras inteligíveis enquanto ele, deitado na cama, assistia a televisão, concordando com a cabeça sem enteder nada. E em como acordava na manhã seguinte, primeiro que ela, e ficava olhando as marcas daquele sorriso torto na escova dela, antes de pegar a sua.

As sobrancelhas temporariamente despenteadas quando passadas suas mãos pelo rosto indo até a nuca, num daqueles momentos de cansaço nos quais ele a pegava no fim do dia, sentada na cozinha anotando mais uma receita, naquele seu vício de reescrever todas as obtidas com as amigas que julgava prendadas, ou no verso dos rótulos de leite condensado.

De como cantarolava “ciranda da rosa vermelha” quando ia lavar a louça. E ficava vermelha assistindo a algum pornô. De como dirigia com a mão no câmbio. E deitava de bruços para ir dormir, depois virava de um lado e dormia, enfim, do outro. O vestido amarelo que ele gostava. O par de argolas que ela gostava. A mania de fazer xixi antes do sexo, mesmo sem vontade. O rabo-de-cavalo que sempre ficava torto. O suspiro doce que acompanhava seus sorrisos. Seus passos pelo corredor. Da sala para o quarto. Da cozinha pra sala. Descalça, de salto, de meia. Sempre pôde ouvi-la passo a passo.

sexta-feira, 20 de junho de 2008

Descrição sem edição

Eu nunca passei por um perrengue danado na vida. Tenho vivos todos aqueles que me pariram. Seja no sentido literal da coisa, seja na distribuição de amores e aprendizados que fizeram de mim o que eu sou hoje: filha, irmã, cunhada, tia, amiga, namorada. Não todas perfeita e igualmente bem, mas todas com aqueles ainda presentes, mesmo na ausência da distância, e isso deve significar alguma coisa.

Além do mais faço a faculdade que eu sempre quis e tenho na cabeceira da cama, sempre, um livro.

Hoje eu tenho saudades de casa. E a saudade sabe ser bem filha da puta, confesso. Mas é diferente. Não foi imposto. Foi escolhido. Não é karma. É destino. E a qualquer hora, qualquer uminha dela, eu posso voltar atrás, se quiser. Até minhas saudades são bonitas.

Isso não quer dizer, porém, que eu não tenha as minhas dores, que eu não chore os meus desencontros comigo mesma. Muito menos que isso tudo que eu sinta seja menos do que sente os que driblaram grandes obstáculos.

Fato é que eu nunca tive desses grandes problemas que todo mundo se compadece. Até eu me compadeço com esse tipo de dores alheias, mas sem de todo senti-las ou desfrutar da inspiração que vem delas. As dores são realmente doídas no corpo e na alma de quem as vive. Eu apenas as observo. E vivo as minhas do meu jeito. De um jeito que ninguém sente pena. Ou reconhece.

Mas isso não faz de mim menos vivida ou inspirada. Esse blog talvez venha a servir como uma prova disso. Ou talvez para que eu me convença do contrário. Fato é que, mais do que todas essas coisas, esse blog nasceu em prol da valorização do meu tempo desperdiçado.

Hoje, o mais grave pelo que passo talvez seja... Não. Talvez seja, não. De fato é. O fato do meu ônibus passar de vez em quando, quando dá na telha, todos os dias da semana (isso sem contar os finais dela e feriados quando simplesmente não passa), condenando-me a uma verdadeira perda de tempo no ponto. (Eu avisei que não sofro de duras penas...)

A maioria do que se tem por aqui, pelos menos o esqueleto disso ou a cereja do bolo, foi por mim escrito e pensado (se pensado e roubado, tem seus devidos direitos autorais..) enquanto eu esperava pelo quase extinto Vila Madalena na porta da ECA.

Porque não só grandes dores geram escritores intensos, assim como longas esperas também.